Após anos de excesso e euforia, a ordem é para abrandar, apreciar, regressar às origens. Uma tendência que não se limita à indústria relojoeira, mas que se estende a todos os mercados, numa época em que se procura a legitimidade, não apenas estética e técnica, mas também ambiental, histórica e cultural. O desejo de excesso acabou, dando lugar a um regresso à simplicidade.
Nos últimos anos, um pouco por todos os mercados, temos vindo a assistir a uma espécie de regresso às origens. Uma tendência forte que tem levado os consumidores a procurar produtos e experiências autênticos e diferenciados que lhes permitam expressar a sua individualidade, reavaliando os hábitos de consumo, passando do materialismo aberto à simplicidade, autenticidade e individualidade e começando a valorizar mais a qualidade e ofertas únicas.
CARTIER Panthère
CARTIER Santos Dumond
De acordo com o relatório da Euromonitor International para os hábitos de consumo em 2019, os consumidores irão favorecer produtos posicionados como simplificados, de volta ao básico e de melhor qualidade. Desde o desejo por viagens autênticas, como uma alternativa às férias organizadas, com foco no local e na autenticidade, bem como no Ecoturismo, a bebidas de fabrico artesanal, passando por produtos alimentares biológicos, esta mudança nos valores dos consumidores favorece um regresso às origens e simplicidade em praticamente todos os sectores da sociedade.
E a Alta Relojoaria não fica imune a esta tendência. Depois de anos de excesso e euforia, testemunhamos um regresso a uma maior moderação, tanto em termos técnicos como estéticos. Longe vão os dias em que nas montras pululavam relógios enormes, com designs vanguardistas e repletos de complicações, cujas indicações se sobrepunham, dificultando sobremaneira a legibilidade da passagem do tempo. Queremos com isto dizer que as complicações morreram e que, agora, teremos apenas modelos com horas, minutos e segundos? Claro que não. Os relógios com complicações continuam e continuarão a existir. A forma como estas são exibidas é que tem vindo a sofrer alterações, sendo muito mais sóbria e clean.
Trata-se, no fundo, de uma espécie de tendência “neoclássica”, baseada em designs muito mais discretos e, sobretudo, muito mais finos, que tem vindo a ganhar popularidade há alguns anos e que tem levado as marcas de alta relojoaria a apresentar modelos pautados pela simplicidade, pureza das linhas e uma escolha restrita de materiais. Será, provavelmente, mais do que uma necessidade de simplicidade, uma procura pelo equilíbrio perfeito, onde a simplicidade é mais uma fachada estética que oculta complexidades técnicas.
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BREGUET
Classique Segundos Descentrados
VACHERON CONSTANTIN
Patrimony
GLASHÜTTE ORIGINAL
Senator Sixties
Edição Anual
AUDEMARS PIGUET
Royal Oak Offshore Cronógrafo
Exemplos práticos não faltam nas colecções das mais conceituadas marcas. É o caso do Breguet Classique Segundos Descentrados, cujo mostrador em esmalte branco eleva a pureza do design a um patamar máximo de sofisticação; ou do Vacheron Constantin Patrimony, cuja face sóbria e simples lhe empresta uma elegância intemporal. Mais ousado, pelas cores que veste, também o Glashütte Original Sixties Edição Anual mantém o mostrador clean, apostando numa sobriedade vintage em tons quentes. E, claro, os clássicos Santos Dumond da Cartier e o Royal Oak da Audemars Piguet, dois exemplos de simplicidade com um toque desportivo.
Inspiração vintage
Este regresso às origens na relojoaria traz também consigo um outro retorno, desta feita às velhas glórias da época de ouro da relojoaria. Os produtos heróicos dessa época – aproximadamente dos anos quarenta até aos anos setenta (ou seja, pós-industrialização e antes da crise de quartzo) – estão a ser re-imaginados e, nalguns casos, recriados ipsis verbis para uma nova geração apaixonada por um óptimo design com um toque vintage.
Também nesta categoria não faltam exemplares dignos de registo. Atentemos, por exemplo, no ícone dos ícones, o Speedmaster Professional Moonwatch, o relógio da Lua, cujo design sofreu poucas alterações ao longo dos anos e um modelo frequentemente revisitado pela Omega, que se mantém intemporal até hoje. Ou o Fifty Fathoms da Blancpain, que, em 2019, recebe uma reedição de um modelo dos finais dos anos 60, o Barakuda.
Também a Breitling mergulhou nos arquivos históricos da marca para recuperar e reeditar a linha Premier, uma colecção de relógios para o quotidiano, originalmente lançada nos anos 40. Já a IWC dedica 2019 à família Pilot. Um ícone entre as históricas colecções da marca desde meados da década de 1930, a linha Pilot desenvolveu-se em paralelo com a aviação, inspirada pelas necessidades de precisão e legibilidade dos pilotos, e mantém-se até hoje como um dos pilares da IWC.
Sejam modelos de inspiração vintage ou peças sóbrias e elegantes per se, a verdade é que o tempo dos “excessos” relojoeiros parece ter ficado para trás, dando lugar a um regresso às origens, onde – como afirmou Leonardo Da Vinci – “a simplicidade é a máxima sofisticação”.