
Radialista, apresentadora, jornalista e actriz, Margarida Pinto Correia abraçou, desde 2003, uma outra paixão: a da Solidariedade.
Desde então à frente da Fundação do Gil e de todos os projectos desenvolvidos por esta instituição – entre eles a Casa do Gil, que contou com o apoio da Tempus Internacional para a sua construção, através da venda dos relógios Swatch Ursinhos e Swatch Casa do Gil –, Margarida fala-nos de si, dos sucessos e dificuldades dos seus projectos e daquilo que a faz sorrir.
Que distância vai, ou que diferença existe, entre caridade e solidariedade?
Toda. A caridade é umbilical e desprendida: “faço o bem porque me dizem que o devo fazer, faço-o e cumpro o meu dever, complemento a sociedade para lá de mim, tapando feridas provisórias e aliviando lacunas”. Lícito, mas inocentemente egoísta e realmente insuficiente. A solidariedade é abrangente, comprometida e de continuidade. Não dou porque posso e quero, mas porque precisam. E porque não me passa pela cabeça que haja quem tenha menos que eu. E porque não quero para os filhos dos outros menos do que o que quero para os meus. E porque acredito que posso, em rede, associando o que eu posso ao que os outros podem, mudar de facto o rumo das coisas. Capacitar. Envolver-me. Devolver dignidade a quem dela precisa, e fazê-lo com dignidade também. A solidariedade faz crescer e envolve-me no compromisso desse crescimento, promovendo a sua autonomização. A caridade colmata feridas abertas mas é muito mais irresponsável da prevenção das próximas feridas…
Quais os gestos na tua educação, que formaram uma personalidade focada em dar como a tua?
ADN. Os meus pais, a minha escola primária, os campos de férias… Ajudou muito crescer com gente adulta que questionava a sociedade e que procurava soluções. Crescer com uma Igreja que não se satisfazia apenas com o que está escrito que deve ser feito, mas sim com a contínua busca de uma melhor construção da sociedade em prol dos outros, mais justa e fraterna. Os escuteiros… os retiros e, em crescida, o prestar atenção aos outros. Não houve um momento. Houve poros abertos, capacidade de captação e oportunidades. Há esta sensação de privilégio, de não caber em mim de gratidão, e isso só pode ser traduzido deixando algum rasto de construção. Considero-me mais uma passagem, um elo de ligação, uma peça de engrenagem que está disponível, do que propriamente um peão importante no caminho da mudança.
Em onze anos de vida da Fundação do Gil, o que sentes que deu mais luta concretizar?
Os projectos traduzem todos necessidades que até 2005 fomos constatando no nosso projecto de base: apoio social na reinserção de crianças indevidamente internadas. Tínhamos e temos todo o tipo de meninos no nosso acolhimento na Casa – que é ainda, ao fim de 5 anos, o único centro de acolhimento com cuidados pós hospitalares (enfermagem) em Portugal. Faz aquilo que advogávamos: que as crianças não podem, não devem ficar internadas quando o serviço hospitalar já cumpriu o seu desígnio de cura. Têm de ser estimuladas e apoiadas, têm de se aproximar da vida real cá de fora, mesmo que ainda necessitem de monitorização do seu estado de saúde, ou de capacitação das suas famílias… e isso a Casa faz muito bem: mais de 110 crianças em cinco anos, é incrível e muito superior às médias de acolhimento e encaminhamento do Estado.
Leia esta entrevista na íntegra na versão impressa da Turbilhão.