Dona de uma voz suave, mas possante, Melody Gardot encontrou na música a força e inspiração para recuperar de um grave acidente. A embaixadora da Piaget, que empresta o rosto e voz à colecção Rose da marca, é uma “artista acidental”, confessa amante de rosas, e cuja versão da eterna música de Edith Piaf é, no mínimo, arrepiante.

Há coisas na vida que não acontecem por acaso. Que o diga Melody Gardot, um exemplo vivo de como se pode retirar algo positivo de uma experiência terrível. Depois de ter sofrido um grave acidente que lhe deixou sérias sequelas, a agora cantora e compositora americana, dedicou-se à música como forma de terapia e praticamente renasceu das cinzas.

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Influenciada pelos blues e jazz de Janis Joplin, Miles Davis, Duke Ellington e George Gershwin, e pela música latina de Stan Getz e Caetano Veloso, Melody Gardot é uma verdadeira cidadã do mundo. No seu coração guarda alguns locais especiais, entre eles Lisboa, uma cidade cujas influências aparecem bem visíveis no terceiro álbum da cantora,The Absence, que inclui uma canção intituladaLisboa.

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No final de Janeiro, em Genebra, na festa de apresentação da colecção de jóias Rose da Piaget, Melody encantou o comoveu os presentes com as suas interpretações deLa vie en Rose, de Edith Piaf, eSodade, de Cesária Évora. Depois falou à Turbilhão do seu envolvimento com a Piaget, da colecção Rose e, claro, de Lisboa.

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Como se tornou embaixadora da Piaget?

Foi muito divertido. Philippe Léopold-Metzger contou-me que a primeira vez que apresentou esta colecção de diamantes ao presidente da Piaget, este lhe perguntou se não sentia a falta de nada. E o que seria? La vie en rose. Foi então que começaram a procurar alguém para cantar a música e, não sei bem como, o projecto acabou por cair no meu colo. Num primeiro momento, fiquei apreensiva, porque ouvia e admirava Edith Piaf, e não dei logo resposta. Depois acabei por ir para o Havai, onde passo o Inverno, e levei a minha guitarra. Um dia, sentei-me sozinha e comecei a tocar e a música simplesmente aconteceu, foi assim que surgiu esta versão. Apercebi-me que, para mim, o significado da música tinha a ver com a minha vida e não com o amor. Tinha um significado totalmente diferente e senti-me bem em cantá-la, porque estava a trazer algo diferente à música. Adoro a colecção Rose. Adoro rosas. Aliás, costumava plantá-las quando era pequena. O conceito de um jardim mostra-nos como se consegue criar as coisas mais belas do mundo, não apenas rosas, mas na vida em geral. De qualquer forma, as rosas são uma excelente metáfora para se aprender como temos de cuidar e amar continuamente, um conceito que é muito importante na vida.

Então a sua ligação à Piaget denota-se mais nesta colecção?

Sim, pela beleza do que fazem. Nem sabia que a colecção era tão evoluída. Quando cheguei aqui hoje fiquei fascinada, porque quando foi a sessão fotográfica para a Piaget só vi onze peças e pensava que essa era a colecção completa. Mas continuaram a fazer mais peças, aprimoraram alguns detalhes… A nível artístico, as peças são fantásticas e, às vezes, parecem tão simples… Mas na verdade estamos a olhar para uma arte de manufactura espectacular. É isso que torna uma peça de joalharia tão fascinante. Se quisermos comprar alguma coisa que perdure no tempo e passe para os nossos filhos, sabemos que uma peça destas irá durar e viver as próximas gerações. A única coisa que tenho da minha avó são jóias normais, que se partiram antes de as poder usar. Mas uma peça destas é como um legado que podemos deixar. Há algo nelas de especial, dizem algo sobre a mulher que as usa, sobre as pessoas, sobre a alegria que tiveram quando as usaram, as experiências nas festas onde foram, a vida que tiveram… Mudou a minha opinião sobre as coisas, porque não sou uma pessoa muito orientada para a estética no que toca ao significado de ter coisas. Vivo em sítios simples, tenho muito poucas coisas, mas tenho de reconhecer um trabalho extraordinário quando o vejo. Criar algo em honra da rosa é tão belo, é uma flor tão bonita. Isto faz-me recordar a minha avó. Reinterpretaram a silhueta e tornaram-na intemporal, podia ter sido criada há 500 anos ou hoje. Respeito isso e adoro-o. Aliás, essa é uma das coisas que adoro também na música, a intemporalidade.

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Sei que esteve em Portugal seis meses, como considera que a cultura portuguesa a influenciou como pessoa e como artista?

Antes de mais, Portugal tem o melhor vinho de sempre. Não conheço nenhum outro sítio no mundo onde possa ir a uma pequena bodega de esquina e gastar 7 ou 8 euros numa garrafa de vinho espectacular. Há mais variedade em França, mas há algo no vosso vinho que é incrível. Costumo ir à garrafeira Alfaia, é a minha preferida e o vinho português de que mais gosto é, sem dúvida, Quinta da Fata Reserva. O que adoro não é apenas o vinho, é o estilo de vida. Sempre que vou a Lisboa sinto que estou numa pequena vila, quando vou ao Algarve ver os meus amigos sinto que estou no paraíso, sempre que vou a Sintra sinto a magia dos tempos. Vemos a igreja mais antiga da Europa em Lisboa, por todo o lado há pessoas a cantar… A primeira vez que fui fiquei mistificada pela luz, pelo coração, pelo fado… E não pelo fado dos grandes espectáculos, pelo de rua. Apaixonei-me pelo som da guitarra portuguesa, não só em Lisboa mas também em Coimbra. Adorei o som e o sentimento de Carlos Paredes. Na verdade, a mulher dele, Luísa Amaro, foi minha professora de guitarra portuguesa durante uns tempos. Quando ela tocava, eu chorava. Sentia que, pela primeira vez, alguém entendia toda emoção que tinha em mim. Só senti isso com a música de Piazzolla e Paredes, porque quando tocam não consideramos o tempo como uma medida, um metro, podemos flutuar alheios ao tempo. Adoro isso. Encontrei partes de mim em Portugal. É claro que adoro muitos sítios no mundo, França, Paris… Adoro todos os locais onde estou.

Sim, também tem uma ligação muito forte ao Brasil…

Cada vez que vou ao Brasil, parece que o meu coração se enche, como se estivesse numa bomba de gasolina a atestar. As pessoas são afectuosas. Fizemos um vídeo com crianças no Brasil, uma das meninas veio ajudar-me e deu-me um abraço tão forte que comecei a chorar, porque ela não largou, simplesmente segurou-me como que para sempre. Esse sentimento de liberdade e felicidade resume-se à ideia de que cada dia é alegre, que não precisamos de nada para sermos felizes que não nós próprios. Quando levei pessoas de outras partes do mundo ao Brasil, e conheceram estas crianças e a forma de viver das pessoas, a experiência fê-las mudar as suas ideias sobre os estereótipos e preconceitos que tinham, perceberam que a felicidade está nas nossas mentes e não nas nossas carteiras. Podemos ter todas essas coisas bonitas, mas também podemos ser felizes sem elas. Para mim, isso foi uma lufada de ar fresco. Cresci num contexto muito pobre e sem nada. Mas era feliz, não me sentia triste porque também não conhecia a vida de outra forma. Foi bom regressar a esse momento e ver o que fui nos olhos dessas crianças. Apaixonei-me por elas… Estamos a desenvolver um programa de música para elas, já há dois anos, mas que quero concretizar rapidamente. O Brasil é incrível, e não apenas o Rio de Janeiro, mas também a Baia e outras cidades. As pessoas são alegres e cantam e eu adoro pessoas que cantam. Tenho amigos a fazerem ligações com a música brasileira, a aproximarem-se deste país. Os músicos estão a ultrapassar as barreiras da linguagem e culturais para trabalharem juntos. Arrepia-me porque vejo aquilo em que acredito tornar-se realidade.