Nome mítico da hotelaria, o Ngorongoro Crater Lodge é considerado um dos melhores e mais luxuosos hotéis do mundo.

Com vista para a cratera de um vulcão extinto onde vivem 25 mil animais de grande porte, é um dos ícones da Tanzânia, país repleto de Parques Nacionais e grandiosas paisagens pintadas com as cores garridas dos masai. Uma viagem para recordar.

Ao escrever as “Neves do Monte Kilimanjaro”, Hemingway tornou mundialmente conhecida a montanha mais alta de África e a paisagem da savana numa época em que fazer um safari ainda era missão para muito poucos. Primeiro a Tanzânia atraiu pioneiros e românticos e depois, já na era do turismo de massas, conquistou o estatuto de destino de sonho. Possui 15 parques nacionais, sendo os mais importantes na região norte do país, como é o caso das terras altas de Ngorongoro, o nosso destino. (…)

Iniciamos esta aventura no aeroporto internacional de Kilimanjaro, onde somos recebidos por um efusivo “Karibu”. Em swahili, esta palavra quer dizer “sejam bem-vindos”, e vai tornar-se a mais ouvida de toda a viagem. Dali a Arusha são cerca de 50 quilómetros. Fundada durante a colonização alemã, esta cidade acolheu o tribunal das Nações Unidas para o genocídio do Ruanda, e é uma das mais prósperas do país. Situada precisamente a meio caminho da lendária travessia “Cape to Cairo”, possui o charme caótico e colorido das cidades africanas, servindo de base aos turistas que chegam à Tanzânia para fazer os já mencionados “safaris do norte”. A entrada em Ngorongoro fica a precisamente 160 quilómetros deste ponto.

O percurso por estrada começa sob a vigília do Monte Meru, a quinta maior montanha de África, ladeada primeiro por plantações de café e depois por dezenas de aldeias Masai, o povo nómada, pastor e guerreiro, que é um dos símbolos da Tanzânia e do Quénia.(…)

Cerca de uma hora depois chegamos a Loduare Gate, a porta de entrada em Ngorongoro e um posto de informação com livros, brochuras e mapas sobre a topografia, ecologia e etnologia do parque. Na verdade, Ngorongoro não é um Parque Nacional, mas sim uma Área de Conservação com mais de oito mil quilómetros quadrados. O vulcão extinto que lhe dá o nome tem três milhões de anos, foi classificado Património da Humanidade pela UNESCO em 1979 e é uma das Sete Maravilhas de África, a par de preciosidades naturais como o rio Nilo, o Delta do Okavango, o deserto do Sahara, a migração no vizinho Serengeti e o próprio Kilimanjaro. É a maior cratera intacta do mundo, mede cerca de 19 km de diâmetro e tem uma superfície de 260 km2, que resulta numa espécie de Arca de Noé onde vivem durante todo o ano mais de 30 mil animais, incluindo os Big Five (com uma população fixa de 62 leões e 25 rinocerontes negros, em risco de extinção).

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Versailles em território Masai

Já falta pouco para chegar ao destino. O Ngorongoro Crater Lodge é um dos hotéis mais famosos do mundo, e há quem diga que o mais romântico. Opiniões pessoais à parte é, sem dúvida, o mais luxuoso dos alojamentos que existem na Área de Conservação e também o mais caro e exclusivo. Esta é, por isso, uma experiência privilegiada.

Este clássico intemporal dos safaris em África é diferente de tudo o que se possa imaginar. A verdade é que tem tanto de rústico como de palaciano. Poderíamos dizer que é um “conto de fadas africano” por de alguma forma a sua arquitectura ser uma recriação surrealista das casas masai (as originais são construídas com excremento de vaca e barro). Por outro lado, todo o lodge é também uma espécie de “delírio barroco” tal a sumptuosidade da sua decoração, onde não faltam lustres em cristal, espelhos e sedas.

Constituído por três campos – o Norte, o Sul e o Tree House -, o hotel (remodelado recentemente para oferecer ainda mais conforto e serviços mais modernos) tem um total de 30 suítes para um máximo de 60 hóspedes, garantia de exclusividade e o atendimento personalizado a tempo inteiro. O check-in faz-se na sala de estar do campo onde ficar alojado. Sentados num sofá de brocados magenta e com um sumo na mão, preenchemos os únicos formulários da estada. Em seguida, somos apresentados a Peter, nosso mordomo pessoal (a formação profissional dos funcionários, todos eles tanzanianos, é uma das prerrogativas da andBeyond, empresa de ecoturismo de excepção que gere mais de três dezenas de lodges dispersos por vários países africanos e asiáticos). O Ngorongoro Crater Lodge possui 18 mordomos para 30 suítes. A estranheza inicial de ter um mordomo desaparece rapidamente. É fácil ficar dependente da simpatia, profissionalismo e mimos de Peter. Ao final de cada tarde, quando regressamos dos safaris, espera-nos um gin tónico e um banho de ­espuma e pétalas de rosa. Como é possível regressar ao mundo real depois desta experiência?

Nas salas de estar (tal como nos quartos) há sempre uma lareira acesa (nos meses de Junho, Julho e Agosto as noites são frias), e todas estão forrados a painéis de madeira. Sofás, cadeirões e pufes criam recantos para conversas a dois. O ambiente é opulento e acolhedor, inspirado nas casas dos exploradores britânicos, não faltando candelabros, espelhos dourados, bandejas em prata, estatuetas indígenas e um sem-número de antiguidades provenientes de todo o continente africano. Apetece ficar aqui durante horas a ler um dos muitos livros à disposição. Por sua vez, na sala de jantar, também ela decorada a rigor, as refeições são servidas num horário alargado, oferecendo aos hóspedes uma selecção de três pratos diferentes (um deles tradicional), pão caseiro e sobremesas, todos eles sempre deliciosos.

Não existe piscina, mas em alternativa os três campos possuem confortáveis terraços com vista panorâmica, onde os hóspedes podem relaxar e desfrutar de uma bebida ou refeições ao ar livre. Mesmo em frente pastam búfalos, zebras e passeiam-se grandes marabus (cegonhas africanas). É possível imaginar melhor? Ainda assim as suítes, de grandes dimensões, e dignas de uma princesa africana, acabam por ser um dos locais de eleição dos hóspedes quando não estão fora, nos safaris. Há vários casais em lua-de-mel, e é fácil perceber porquê ao olhar a vista a partir de cada quarto. O microclima, feito de sol, chuva e nevoeiros, contribui para criar uma atmosfera romântica.

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Além dos dois safaris diários, entre os passeios da praxe está a duna de areias magnéticas de “Shifting Sands”, uma caminhada de meio-dia pelas aldeias e pastagens Maasai e a visita ao desfiladeiro Olduvai Gorge, um dos berços da Humanidade. No entanto, se quiser aventurar-se para um território mais virgem, fazer percursos mais atribulados, e até cair numa toca de hiena (como nos aconteceu), sugerimos que acorde muito cedo e peça que um guia o leve para norte, em direcção ao lago Ndutu, já na fronteira com o Serengeti e suas planícies sem fim. Aqui poderá ver centenas de gazelas, gnus, zebras, girafas, elefantes, abutres e até ter a sorte de assistir a um grupo de chitas a caçar. Muito velozes, são os únicos animais que só comem a carne (fresca) que caçam. Cereja no topo do bolo seria ficar mais uns dias na Tanzânia, fazer um desvio para ver as “neves eternas” de Kilimanjaro e, quem sabe, dar um salto até à Mnemba Island (ao lado de Zanzibar), mas fica para a próxima viagem!

Jornalista Viciada em hotéis, Catarina Palma está sempre a par das últimas novidades da hotelaria mundial. Começou a trabalhar no jornal PÚBLICO, mas foi a escrever sobre viagens que descobriu a sua verdadeira paixão. “Quem quer escrever sobre políticos, quando pode escrever sobre o melhor do mundo?” Directora da Rotas & Destinos durante mais de 10 anos, revista de viagens que deixou saudades, coordena actualmente o projecto Lisbon Shopping Destination e escreve sobre temas de luxo e lifestyle para diversas publicações, como a TURBILHÃO.