“Na Bulgari não é a estética que se submete à técnica mas a técnica que se submete à estética”.
Quem o afirma é Guido Terreni, o director da Bulgari Horlogerie SA, o braço relojoeiro da casa joalheira Romana, que assim tece um confronto directo com o que diz ser o “modus operandi” da maioria das marcas de alta relojoaria suíça. A opinião de Fabrizio Buonamassa Stigliani, o responsável pelo centro de design dos relógios Bulgari (e um homem que considera ser essencial poder reconhecer um objecto a pelo menos 10 metros de distância sem ter necessariamente de ver o logotipo), segue o mesmo caminho: “Em Itália temos uma percepção distinta da beleza, que não se resume apenas a um conceito filosófico. É antes algo que podemos sentir, ouvir e saborear em cada momento das nossas vidas. Para nós, italianos, trata-se de uma espécie de experiência através da qual procuramos a perfeição em todos os detalhes. Como marca seduzida pelo design, gostamos de jogar com restrições e limites, e muitas vezes são essa mesmas restrições que impulsionam e definem a estética do objecto, resultando frequentemente num ponto de viragem do projecto.
O facto é que nunca sabemos quando a ideia irá chegar, já que é impossível gerir a criatividade. No entanto, temos de a alimentar, e a Itália é um dos locais ideais para o fazer, devido à multiplicidade de fontes de inspiração, como a arquitectura e a arte. Por isso acredito que é necessário observar e sentir muitas coisas para tirar o máximo partido de um design”.
No entanto, a sensibilidade tipicamente italiana para o design de que fala Buonamassa não impediu a necessidade de proximidade dos centros relojoeiros suíços. Um aspecto que, levou a que há cerca de sete anos, a Bulgari decidisse passar o seu centro de design de Roma para Neuchatel, de forma a permitir a rápida concretização do fluxo de ideias. Um período que coincidiu com o desenvolvimento da renovada colecção Octo, um modelo criado originalmente pelo célebre designer Gerald Genta e que o lápis de Fabrizio Buonamassa tem sabido adaptar magistralmente ao momento presente.
Trata-se de um modelo bastante especial, que esconde por baixo do seu círculo um octógono, uma antiga figura gráfica universalmente reconhecida como dotada de uma riqueza de símbolos e significados, e que está inseparavelmente ligada à história das civilizações e culturas. Conceitos como equilíbrio, harmonia, poder e eternidade são frequentemente associados à forma de oito lados. Na Europa Medieval, os alquimistas consideravam a combinação do quadrado e do círculo como a própria expressão da perfeição, bem como da relação entre a Terra e o Céu: o quadrado, representando a Humanidade, e o círculo, que incorporava a Divindade, estabelecia o elo entre as duas representações.
Segundo Guido Terreni, a ideia para a nova colecção surgiu em 2011, quando a marca se começou a aperceber de que a linha Octo estava a ficar um pouco desactualizada. Foi neste momento que a Bulgari decidiu mudar as regras do jogo, trazendo a colecção para mais perto de uma elegância italiana que acabou por associar a uma estratégia de manufactura: “Nessa altura ainda não tínhamos os movimentos necessários, pelo que foi a partir deste ponto que eles começaram a ser desenvolvidos. Desde Julho de 2000 que a Bulgari tinha começado um processo de incorporação de competências relojoeiras ao mais alto nível, ao assimilar a Gerald Genta e a Daniel Roth. Particularmente com a produção de movimentos com um elevado número de complicações, onde mais de 900 componentes não são fora do comum, a questão da construção com especial atenção à espessura criou desde logo uma competência no domínio do extra-plano”. Apresentado ao público no início de 2012 em Roma, no Complexo Monumentale Santo Espirito, em Sassia, o estrondoso sucesso global obtido pelo novo Octo acabou por encorajar a Bulgari a criar uma colecção de modelos sob o signo do extra-plano. Um projecto que Buonamassa levou, literalmente, aos limites do possível
2014 – Octo Finissimo Tourbillon
Recorde de Espessura para um Movimento com Turbilhão
“Os detalhes fazem a perfeição, e a perfeição não é um detalhe”
Leonardo da Vinci
O primeiro Octo superlativo surge em 2014, em plena comemoração dos 130 anos da Bulgari, e privilegia a inclusão de um escape de turbilhão que, na sua estreia, arrecada de imediato o título de relógio com menor espessura do mundo a integrar esta complicação. Com um movimento de corda manual com apenas 1,95 mm de espessura (mais fino do que uma moeda de 2 euros), acabou por ser a altura do turbilhão voador deste relógio a definir a medida do próprio calibre.
É que, habitualmente, a gaiola de um turbilhão é bastante espessa, uma característica que compromete a integração desta complicação num conceito extra-plano. Era, pois, necessário desenvolver uma metodologia de construção inovadora, que acabou por surgir na forma de uma mono platina destinada a receber todos os componentes, entre eles o turbilhão, que, aplicado a um sistema de rolamentos montado ao redor em vez de em cima da gaiola, acabou por poupar pelo menos 1 mm de espessura, ainda na fase de planeamento.
Uma solução inédita, que permitiu a duplicação da espessura da mola do tambor de corda, expandindo desta forma a autonomia para perto das 55 horas. Com 249 componentes incorporados numa caixa de platina, o Octo Finissimo Tourbillon totaliza 40 mm de diâmetro e representa o primeiro passo da Bulgari no campo dos extra-planos.
2016 – Octo Finissimo Minute Repeater
O Repetição Minutos mais Fino de sempre
O estudo inicial efectuado para o repetição de minutos terá dado origem à versão final, em termos de volumetria e estética, da linha Octo Finissimo, mesmo ainda antes da apresentação da versão inaugural com escape de turbilhão. Sendo ainda considerada como a complicação mais exigente no universo da relojoaria mecânica, a repetição de minutos exige um número considerável de especificidades e regras na sua construção, assim como um domínio total de determinadas artes, de forma a se alcançar o melhor resultado possível: uma sequência uniforme e regular de batidas com um som cristalino e intenso, assim que o mecanismo é activado. Um desafio exigente, ampliado pela norma de que, quanto maior o volume da caixa, maior o volume de som produzido. Só que neste caso, a espessura do modelo não ultrapassa os 6,85 mm, enquanto que o calibre BVL 362 se satisfaz com uns exíguos 3,12 mm para acomodar nada menos que 362 componentes.
A solução para este desafio acabou por ser encontrada na conjugação de aspectos estéticos e técnicos, como foi o caso da opção do titânio para a caixa que, neste caso, potencia a reverberação dos gongos. No caso do mostrador, onde o número 12 e os indexes se apresentam recortados, as aberturas resultantes assumem um carácter estético bastante apelativo, mas também técnico, ao permitir a passagem do som dos gongos que assim se propaga pelo volume total da caixa. Um excelente exemplo onde a estética se submete, efectivamente, à função.
2017 – Octo Finissimo Automatico
O Movimento de Corda Automática mais Fino de sempre
“A aparência requer calma e finesse: a verdade, calma e simplicidade”
Emmanuel Kant
Passados três anos da apresentação do Turbilhão, e apenas um ano após a apresentação do repetição de minutos, a Bulgari volta à carga e revela o Octo Finissimo Automatic, o relógio extra-plano de corda automática mais fino do mercado. Com apenas 5,15 mm de espessura total, para um diâmetro de 40 mm, e incorporando um movimento com apenas 2,23 mm, a marca romana explorava mais uma vez os limites do exequível. Um exercício de micromecânica onde cada componente, sem excepção, teve de ser pensado desde a sua génese com o propósito de alcançar a espessura mais reduzida possível, o que engloba todo e qualquer elemento da caixa, e mesmo da pulseira. O resultado é o calibre BVL 138, cuja frequência de oscilação de 21.600 aph garante uma autonomia de 60 horas com origem num micro rotor de platina.
2018 – Octo Finissimo Turbilhão Automático
O Turbilhão de Corda Automática mais Fino do Mundo
“A combinação do design com movimentos extraordinários dá origem à criação de lendas”
Jean-Christophe Babin – CEO Bulgari
Acumulado o conhecimento decorrente do lançamento, em 2014, do Finissimo com escape de turbilhão e, em 2017, do calibre BVL 138 de corda automática, 2018 assiste à conjugação lógica das competências ganhas com ambos. O lançamento do Octo Finissimo Turbilhão Automático leva a elegância contemporânea masculina para um nível cimeiro, onde a marca de 3,95 mm representa novamente um recorde do mundo. Quanto ao movimento do Calibre BVL 288, os exíguos 1,95 mm parecem ser suficientes para redefinir as fronteiras da alta relojoaria contemporânea. Segundo Guido Terreni, desde o início do projecto que a escolha da linha Octo, assim como as dimensões do modelo, estavam definidas e deveriam contribuir para a criação de um modelo topo de gama que permitisse, simultaneamente, uma utilização como relógio de uso diário.
Uma orientação que acabou por colocar o movimento de corda automática na base deste conceito: “O desenvolvimento do calibre automático acabou por demorar bastante tempo, devido à complexidade em associar um micro rotor a um movimento com estas dimensões. O calibre com escape de Turbilhão acabou por ser lançado apenas em 2014 e, neste caso, com sistema de corda manual, exactamente devido a essa complexidade”.
Apesar do “tour de force” tecnológico representado por estes Finissimo, é o design italiano evidenciado pelos Octo que mais se destaca. Eminentemente puro, trata-se de um estilo que recusa o propósito redutor de um carácter meramente decorativo, submetendo-se ás regras essenciais da proporção. Algo perfeitamente normal, ou não tivesse Fibonacci nascido em Itália.