
Porto. A mera menção da palavra leva-nos a conjurar imagens de catedráticos cheirando e girando copos do vinho rico e cor de rubi, discutindo filosofia ao lado da lareira.
Um vinho de profundidade, concentração e estrutura majestosa, o Porto é produzido a partir de uvas criadas nos declives rochosos dos socalcos da região do Alto Douro, no Norte de Portugal, e foi descoberto durante o século XVII, quando dois comerciantes britânicos adicionaram brandy para preservar o vinho local para uma viagem marítima pelo Atlântico.
Os pioneiros do comércio do vinho do Porto rapidamente descobriram que esse “fortalecimento” fez muito mais do que apenas proteger o vinho. Na realidade melhorou-o, conferindo-lhe o poder de maturar em algo único, transformado nas frescas e pacíficas caves que se aninham nas ruas apertadas de Vila Nova de Gaia, do outro lado do estuário do Rio Douro, frente ao Porto.
Grandes sinais sobre os telhados de terracota anunciam os grandes nomes do mundo do vinho do Porto – Cockburns, Ferreira, Sandeman e Taylors. Muitos oferecem provas e excursões aos visitantes, e é aqui que nos encontramos numa soalheira tarde de Outono.
Rapidamente nos apercebemos que existe mais no universo do vinho do Porto do que observar um fumador de cachimbo abrir uma garrafa do misterioso néctar púrpura uma vez por ano depois da Ceia de Natal. Rubis, tawnies e vintages… quanto mais se prova, mais se percebe as complexidades dos tipos e estilos produzidos – ou pelo menos é a minha desculpa. E assim poderíamos ter ficado dias, mas é tempo de baixar os nossos copos, pelo menos por agora, e viajar até ao espectacular Vale do Douro Património da Humanidade, onde o luxuriante líquido é produzido.
Do Porto, seguimos para sudeste em direcção ao Vale do Douro. As vinhas crescem nestas encostas remotas desde os tempos pré-romanos, plantadas em fileiras de socalcos murados, o produto de séculos de labuta e sentimento. O Rio Douro está sempre presente – serpenteando através de padrões abstractos de vinhas cor de ferrugem que se empoleiram nas vertiginosas e íngremes encostas do vale.
Conduzir pela região das uvas é puro prazer, com cada paisagem melhor do que a anterior. Estamos no final de Setembro e é época da colheita. Pontinhos coloridos de colhedores carregando os seus cestos pontuam as encostas. Um aroma doce e inebriante enche o ar, e cada um em dois veículos que passam parece ser um tractor que puxa um atrelado carregado da preciosa fruta.
Na Quinta Seara d’Ordens, perto da cidade de Peso da Régua, perguntámos a António Moreira (um dos três irmãos que gerem o espaço); “Quais os segredos para se fazer um bom Porto?” “Se não tivermos boas uvas, não temos um bom vinho. O clima também é importante, assim como os socalcos que ajudam a reter a humidade no solo”, diz Moreira.
A lista de vinhos do Porto e de mesa da Quinta Seara d’Ordens ganhou vários prémios em concursos vinícolas nacionais e internacionais. “Recentemente ganhámos uma medalha de ouro por um Ruby Reserva”, diz Moreira, retirando algum vinho de uma barrica, vertendo-o num copo e segurando-o à luz. “Possui uma cor rubi vivida e profunda, aromas frutados pronunciados equilibrados por notas de baunilha transmitidas por carvalho. Mas o vinho fala mais articuladamente do que eu.”
A vários quilómetros dali, na Quinta da Pacheca, uma equipa de vários homens com braços entrelaçados marcham dentro de um grande lagar de pedra, ao ritmo das ordens do chefe do grupo. “Um, dois, esquerda, direita”, grita Álvaro para a sua equipa de pisadores de uvas composta por Alberto, João, Zeca, Vigia, Zegirão e Constera. É como um cruzamento entre os All Blacks antes de um jogo de rugby e uma cena dos Monty Python.
Mas isto é algo sério. Todo o trabalho árduo serve para extrair o máximo de cor e sabor das uvas sem esmagar as grainhas e os caules que darão ao vinho uma ponta tânica. Depois de caminhar sobre as uvas ao longo de vários comprimentos do lagar, a equipa faz uma pausa e depois repete o processo. “As máquinas ainda não conseguem igualar a sensibilidade do pé humano”, diz Álvaro.
Depois de testemunhar esta curiosa tradição, dificilmente haverá um local mais apropriado para passar a noite do que o hotel de cinco estrelas Vintage House, no Pinhão, situado mesmo à beira do Rio Douro, rodeado por socalcos de vinhas. Se o Vale do Douro é o berço do comércio de vinho do Porto em Portugal, então o Vintage House Hotel é o epicentro. Aqui tudo destila classe, qualidade e conhecimento do néctar púrpura.
Na Academia de Vinho do Vintage House Hotel, os conhecedores de Porto podem encontrar uma loja de vinhos onde podem provar e comprar alguns dos melhores e mais raros portos da região, além de poderem participar em provas guiadas, cursos de vinho, provas de Porto e chocolates e jantares gourmet.
Nós passámos uma noite de convívio no Bar Library junto ao brilho acolhedor de uma lareira, vendo uma garrafa de Taylors Vintage ser aberta num ritual ancestral. Em vez de se usar um saca-rolhas, primeiro a garrafa é colocada de lado numa cama de arame. O pescoço é então cortado usando um par de línguas especial chamado tenaz que foi pré aquecido a alta temperatura. Isto é feito por causa das rolhas moles e para evitar que os sedimentos sejam perturbados dentro da garrafa. Uma vez decantado, o Porto vintage, como todos os vinhos envelhecidos, deverá ser idealmente consumido no dia em que é aberto ou, pelo menos, em poucos dias. Tradicionalmente, o decanter do Porto é passado à volta da mesa no sentido dos ponteiros do relógio.
GUIA PARA O VINHO DO PORTO
O Porto é produzido parando a fermentação do sumo da uva mais cedo, adicionando aguardente vínica (que é 77% límpida e incolor). Isto aumenta o conteúdo de álcool, mas permite ao vinho manter o doce intenso e a cor.
Sendo fortificado, o Porto é capaz de envelhecer em madeira por muito mais tempo do que a maioria dos outros vinhos – de dois anos a muitas décadas, dependendo das características e potencial. Pode maturar no barril, cuba ou garrafa – ou numa combinação destes. Os diferentes períodos e métodos de envelhecimento deram origem a uma diversidade de diferentes estilos, cada um com o seu carácter distintivo.
ESTILOS DE PORTO
Porto Ruby
Este é o estilo básico. Os Portos Rubis são vinhos jovens frutados e encorpados, maturados em barris de carvalho e com uma mistura de vinhos de um ou mais anos para assegurar a continuidade do estilo.
Porto Tawny
Todos os tawnies são envelhecidos apenas no barril, engarrafados e depois preparados para serem consumidos. Os tawnies básicos são envelhecidos durante cerca de dois a três anos. O Porto Tawny é servido tradicionalmente antes ou depois de uma refeição, com queijo forte.
Porto Tawny envelhecido
Se um Porto fino puder envelhecer por muitos anos em barris de carvalho, irá gradualmente perder a sua cor rubi original e assumir um delicado tom acastanhado, conhecido como “tawny”. Os tawnies envelhecidos podem ter dez, 20, 30 ou 40 anos. Um tawny envelhecido possui uma profundidade de sabor incrível tornando-o perfeito como vinho de sobremesa, casando especialmente bem com pratos de chocolate, café ou amêndoas.
Porto Vintage
Este é o principal Porto de todas as casas e o melhor e mais raro de todos os vinhos do Porto. É uma selecção dos melhores vinhos de um único ano excepcional e representa apenas uma pequena proporção da colheita (os anos vintage são declarados pelo Instituto do Vinho do Porto). O Porto Vintage é envelhecido durante dois anos em carvalho, depois engarrafado. Irá maturar por muitos anos ou décadas na adega desenvolvendo lentamente os poderosos aromas inebriantes e o sublime sabor opulento que são as características distintivas de um verdadeiro Porto vintage. Tradicionalmente servido sozinho no final de uma refeição, ou com nozes ou frutos secos, ou com um puro de luxo.
Vintage Tardiamente Engarrafado
Vinho de um bom ano que é maturado em barris durante cerca de quatro a seis anos antes de ser engarrafado. Ao contrário dos Portos vintage clássicos, permanecerá em boas condições durante várias semanas depois de aberto. É o Porto perfeito para acompanhar um queijo forte, particularmente o queijo azul Stilton.
Porto Vintage Single Quinta
Em anos em que o vintage não é declarado, pode decidir-se engarrafar um Porto Vintage Single Quinta. Este é feito inteiramente de uvas de uma única vinha, e possui o nome da propriedade individual na etiqueta.
Porto Branco
Feito a partir das variedades de uvas brancas da mesma forma que o rubi básico. Porto branco seco é o aperitivo clássico em Portugal, bebido gelado e servido com azeitonas e amêndoas torradas.
COMO DESFRUTAR DE UM PORTO VINTAGE
Algumas regras simples podem aumentar o seu prazer ao desfrutar do melhor de todos os vinhos fortificados. O Porto vintage matura numa garrafa escura e espessa com uma rolha de cortiça de grande impulsão, para proteger o conteúdo durante muitos anos maturando na adega. É aconselhável guardar a garrafa de lado para prevenir a rolha de secar.
À medida que o Porto vintage matura na garrafa, um sedimento natural ou borra forma-se no fundo da garrafa. Como tal, é aconselhável decantar o vinho, vertendo-o com cuidado para outro recipiente, deixando o depósito para trás antes de servir. Tal como todos os vinhos envelhecidos em garrafa, o Porto vintage deve idealmente ser bebido no dia em que a garrafa é aberta ou, pelo menos, em poucos dias, porque o contacto com o oxigénio pode estragar o valioso conteúdo.
PROVA
Os grandes nomes do mundo do Porto (tal como Taylors Cockburns, Ferreira e Sandeman) possuem as suas adegas ou caves em Vila Nova de Gaia nas margens do Rio Douro, no Porto. A maioria oferece provas e excursões aos visitantes, e os Portos estão disponíveis para compra no local, muitas vezes por preços melhores. Para mais informação sobre visitas e provas de vinho nas quintas do Vale do Douro www.dourovalley.eu.